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Adriana Moreira é destaque da nova geração do samba paulista

 

Ela está na contramão de tudo: não faz o que a mídia pede e não adequa seu repertório à lógica do lucro. Mantém sua essência preservada e faz da música um espelho de suas raízes. A personalidade é forte e ela não nega a intensidade com que se doa para cada novo projeto. “Ou eu vou muito ou eu não vou nada”, conta. Adriana Moreira é uma das cantoras de samba da nova geração.

 

Antes de se encontrar na música, Adriana pensava em cursar Direito e ser juíza. Na infância, porém, as cantorias já surgiam, mesmo que como brincadeira. Sem o aparato de hoje, improvisar era necessário: um cabo de vassoura como microfone e  a espontaneidade digna de uma criança.

 

 

 

 

 

 

 

A ousadia de Adriana na música não começou por acaso. Era casada com um dos amigos de Carlinhos Vergueiro, compositor e cantor de sucesso. Eles frequentavam um dos primeiros grupos de samba de São Paulo - o mutirão do samba. Adriana, por conta disso, pôde fazer parte e conhecer as entranhas da música, saber como ela era feita e como assuntos tão importantes e pertinentes eram levados para a roda. Falava-se em cultura, classes e até mesmo questões relacionadas ao gênero.

 

Houve uma voz feminina nesse grupo, a de Ana Valença, capaz de enxergar o quanto Adriana acompanhava timbres e era afinada. Diante disso, sugeriu que a cantora procurasse apoio, um lugar em que ela pudesse explorar esse dom. Adriana seguiu o conselho e resolveu participar da seleção da Universidade Livre de Música Tom Jobim (ULM).

 

A fila dobrava quarteirões, Adriana estava nervosa com o que via - muitas meninas aquecendo voz, fazendo exercícios que hoje ela entende para que servem. Mais uma vez, diante dos jurados, ousou. Cantou Cartola - “Disfarça e Chora” e conseguiu classificação como “soprano” devido ao nível agudo da voz. Da conquista de uma vaga, nascia um projeto de cantora de carreira solo, apesar de ficar como backing vocal de muitos artistas, por um bom tempo.

 

Ainda estudando, a cantora soube do lançamento do disco “Diplomacia”, do cantor e compositor baiano Oscar da Penha, mais conhecido como Batatinha, veja o acervo online aqui. Apesar de já falecido quando a obra foi lançada, Batatinha mexeu com Adriana. Ele, que já fazia parte do berço musical dela, agora seria um dos guias de seu samba. A cantora gostaria que o maior número de pessoas o conhecesse. Foi então que sugeriu ao dono do antigo Bar do Quilombo, situado na rua Artur Alvim e conhecido por seus tributos à sambistas, que ela organizasse uma homenagem à Batatinha. O dono do bar marcou para dois meses depois e ainda contou que o filho do cantor frequentava o estabelecimento.

 

Adriana não bambeou e lotou a casa noturna em sua primeira apresentação solo. Daí em diante, passou a ser dona desse show. A família do Batatinha a procurou para entregar uma série de canções inéditas e gravadas por ele. A Bahia abriu suas portas para essa nova interpretação das músicas de seu compositor. “Direito de Sambar” foi o primeiro disco de Adriana. "A minha história com o Batatinha é de outras almas, ele me deu tudo o que tenho", conta. 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Foto: Acervo Batatinha

 

O começo de carreira, como de costume, foi bem difícil. Adriana era sua própria produtora e, portanto, tinha responsabilidade de buscar o que queria, não podia esperar a iniciativa de alguém. Ela ligava, se passando pela irmã e marcava reuniões com produtores. "A verdade é que eu mesma ligava. Alguns percebiam pela voz. Mas eu dizia que as nossas vozes [dela e da irmã] eram muito parecidas", ri da lembrança.

 

O segundo CD é a tradução das origens de Adriana. “O nome do álbum - “Cordão” - não é a toa, traz a minha ancestralidade. É algo que me amarra, mas não faz mal”, comenta. As amarras de que fala a cantora são as ligações dela com o seu passado e de sua família, a identificação com o Candomblé, os laços com os negros. O avô dela, Jayme de Aguiar, é o fundador do “Clarim da Alvorada”, um dos jornais alternativos de grande destaque na imprensa negra paulista.

 

A história dos antepassados de Adriana e a busca pelas suas origens traz a tona um engajamento  social que se revela também através de sua música. Ela canta somente o que a agrada e aboliu canções machistas  do seu repertório. Já sofreu preconceitos por ser mulher e estar no palco. O ambiente é muito masculino, não só nos palcos, mas nas escolas de samba também.

 

Foi convidada para ser intérprete, e durantes as duas tentativas, a experiência foi traumatizante. Em uma, o microfone estava desligado durante o desfile, na outra um homem recém chegado ao grupo de intérpretes quis tirar o microfone dela. O primeiro caso foi na Escola de Samba Camisa Verde e Branco, escola do coração de Adriana. “Eram 6 puxadores. E eu era a única mulher. Na hora que as câmeras apareciam, eles me fechavam. Meu microfone veio desligado na avenida”, relembra. Ela jurou não pisar mais em quadras de  escola se o propósito fosse puxar o samba enredo.

 

O espaço do samba na mídia sempre foi pequeno. “Esse tipo de música não é visto com bons olhos”, comenta. A mídia tem o poder de definir o que é veiculado e não é democrática nesse sentido. O samba sofre com isso, perdendo o espaço que deveria ser dos cantores da nova geração.

 

A mulher no samba, por sua vez, precisa mostrar que tem algo além de um belo par de pernas. “É mais fácil ouvir uma música lá na TV que vai do nada pra lugar nenhum, de uma realidade que não é nossa. Meu trabalho é trazer essa realidade para as pessoas”, critica.


 

ENTREVISTA - Adriana Moreira
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Ouça trechos da entrevista com Adriana Moreira:

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